terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Rituais de Sofrimento

Silvia Viana
 
Constrangimento, dor, palavrões, excreções, sensualidade vulgarizada, piadas de mal gosto. Este é o panorama da grande maioria dos programas humorísticos do Brasil, mais especificamente o Pânico na TV, exibe o que há de melhor no humor e o de mais pobre na humanidade. Um humor sem graça, mas muito apoiado e curtido por muitos.

A autora Silvia Rodrigues, em seu mestrado que virou livro, lançado em outubro deste ano, traça os caminhos do Rituais do Sofrimento, apresenta os porquês da espetacularização da violência, do humor grotesco, dos realitys alcançarem sucesso facilmente e conquista fãs. 

Fazendo uso de um estudo de caso, analisa os rituais e mecanismos de dominação em vários produtos televisivos da indústria cultural brasileira, com especial atenção ao maior deles, o Big Brother Brasil, no ar há treze anos. O estudo também abrange programas e filmes de Hollywood que perpetuam a mesma lógica brutal. Assim como no BBB, o assassino Jigsaw da franquia Jogos Mortais, por exemplo, não almeja a morte/eliminação de suas vítimas: ele quer que elas sobrevivam. Mais que isso, que sobrevivam a qualquer preço.

Bibliografia: RODRIGUES, Silvia Viana. Rituais de sofrimento. São Paulo, 2011. Disponível em PDF


Trecho do livro 

“A dificuldade de se escrever a respeito da ideologia hoje é que para o juízo bastaria a descrição, mas essa já não o (co)move. Se uma pessoa se mostra crítica ou mesmo condoída diante do sofrimento que se avoluma nesse tipo de programa de TV, a ela caberá a pecha de idiota (ou invejosa!). A dominação se mostra a céu aberto em dia claro, sem que se renuncie à sua prática. Todo discurso a respeito de justiça, liberdade, igualdade e até mesmo bondade é descartado com virilidade em nome de uma dura realidade. [...] Não são poucas as vezes em que coloco o problema do sofrimento ao qual são submetidos os participantes e a resposta é: “Mas foram eles que se voluntariaram”. 


Uma das ideias centrais que sustentam o estado de direito é a da inalienabilidade: não se pode abrir mão da dignidade, por exemplo, mesmo que se queira. Em tese, nenhum contrato assinado pelos participantes de reality shows poderia ser válido em qualquer lugar no qual a democracia e os direitos humanos vigoram. E o problema jurídico posto por essas produções não responde sequer ao paradoxo dos direitos humanos colocado por Hannah Arendt, segundo a qual tais direitos só podem ter vigência quando levados a cabo pelos estados nacionais, ou seja, os apátridas não os têm. Os participantes são cidadãos brasileiros, alemães, norte-americanos, holandeses, argentinos e um longo etc. A vida à disposição da produção de entretenimento a que se assiste em reality shows é um índice mais do que transparente de que vivemos em um estado de exceção permanente, pulverizado e onipresente.” 



Sobre a autora 


Silvia Viana possui graduação em ciências sociais, mestrado e doutorado em sociologia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP). Suas áreas de estudos são sociologia, crítica cultural e filosofia, com ênfase em teoria crítica contemporânea, teoria sociológica e sociologia da cultura e nos temas ideologia, indústria cultural, consumo, trabalho e subjetividade. 




VIANA, Silvia. Rituais de Sofrimento. Editora Boitempo, 2013, 190 páginas. 

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